sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Sobre o sequestro em Santo André, terminado hoje

O medo correspondeu às expectativas
Policiais entram em horário de verão antes do previsto, agem tarde demais e não evitam tragédia

'Conturbada' é o adjetivo mais apropriado para o quesito 'segurança pública' no Brasil essa semana. Se Salvador nos últimos meses sofrera recorde de baixas policiais, o resto do Brasil não conseguiu evitar baixas civis por incompetência (entenda civil como pessoa comum, e não polícia civil). Há quem ainda teste os limites da fraca polícia brasileira e consiga êxito, confirmando a tese de que não devemos confiar nas próprias pessoas que cuidam da segurança em nossas cidades.
Em São Paulo, a greve da polícia civil não chegou a parar todos os setores das delegacias (tanto que o fim do seqüestro de 100 horas terminado hoje contou com a colaboração destes), e quando estes foram protestar por melhores condições de trabalho, adivinhe de onde vinheram atos de coibição? Da polícia militar (que hoje mesma trabalhara em conjunto com estes), ordenada pelo governo a silenciar seus colegas na base do cacetete, só que como do lado dos manifestantes todos sabiam bater igualmente, o fato virou um confronto disputadíssimo. Eu jamais imaginaria que um dia leria matéria acerca de um confronto armado entre policiais no meio das ruas (já não bastasse confronto entre traficantes rivais, não sei o que se pode esperar se tratando de ‘confronto’ neste circo chamado Brasil, talvez quem sabe ‘câmera de deputados Vs Senado’, a base das ‘cadeiradas’).
Não gosto de adotar todos os modelos que dão certo no exterior para se adequarem aqui no Brasil (foi 'valorizando demais' o que vem de fora que fizemos uma revolução negativa no nosso setor de transportes de carga, dispensando os trens -mais seguros, velozes e sem danos para estradas- e trazendo os caminhões), mas certamente, em termos de segurança pública, deveríamos olhar para o modelo dos Estados Unidos, onde a hierarquia não é tão complexa (nos EUA há só uma polícia, comandada pelos municípios, enquanto no Brasil há a civil e a militar, comandadas pelo governo estadual) e seus profissionais são mais eficientes não só para reprimir crimes, como também para prevenir.
"O procedimento da Swat é negociar por até 24 horas, depois o segundo passo é a invasão e o terceiro recurso é o uso dos atiradores de elite, ou snipers. Mas no Brasil não há esse limite de tempo".- comenta o brasileiro Marcos do Val, policial da Swat em Dallas há 9 anos, sobre o demorado seqüestro em Santo André esta semana. Marcos, de férias no Brasil, vem acompanhando toda a rotina das negociações, contou para seus colegas do Texas, e estes não acreditaram na demora da polícia. Algumas fontes afirmaram que a polícia só agiu após o 1º de 2 tiros (afirmou um policial que não quis se identificar), e outras afirmaram que os tiros disparados pelo seqüestrador foram frutos da invasão policial mal planejada(como afirmou um espectador anônimo).
As unidades especiais da polícia americana (a exemplo da SWAT- Special weapons and tactics- e FBI- Federal Bureau of investigation), por mais que filmes hollywoodianos colaborem para sua fama de 'infalíveis', lidam com situações muito mais difíceis muito mais vezes (os criminosos nestes casos são tão especialistas nas suas ações como os próprios policiais), mas a nossa melhor polícia, a GATE (Grupo de ações táticas especiais) não conseguiu solucionar um seqüestro 'amador' (realizado por um jovem inexperiente e sem tantos recursos táticos ou apoio), demorou para agir, e de quebra acabou com um desfecho trágico: as duas jovens foram baleadas, sendo que uma delas está em estado gravíssimo por levar um tiro na cabeça.
Sobre o caso deste seqüestro (que começou na 2ª feira a tarde, quando Lindemberg, 22, foi a casa da ex-namorada Eloá, 15, que estava estudando com colegas, e a fez de refém junto com sua melhor amiga Nayara, 15, e dispensou os outros - lembrando que o atual namorado de Eloá iria para o estudo, mas acabou tendo indisposição estomacal, o que pode ter lhe salvado a vida), vale lembrar como se resumiu a cobertura da mídia: até a 6ª feira a tarde, Lindemberg não era visto como 'tão perigoso' (pelo fato de não ter antecedentes criminais e trabalhar) para um canal de 24 horas de notícia que passara todos esses dias dando enfoque especial ao caso (inclusive convidando um psicólogo e um advogado para serem comentaristas).
O psicólogo se mostrava demasiadamente compreensivo com o comportamento deste jovem (tratando este ato com uma 'flexibilidade' irritante), e o advogado contava o tempo em que o jovem passaria preso (que inicialmente seriam de 2 a 8 anos- antes dos disparos às refens), alegando sempre que 'por não se tratar de um criminoso em busca de dinheiro e sim um jovem agindo passionalmente', sua pena poderia ser reduzida e certamente ele ‘levaria uma vida normal’. Teve quem foi dar apoio àos pais das reféns, dando a 'certeza' de que tudo terminaria certo (mesmo sem conhecer o seqüestrador em questão e sem ter noção da inoperância da polícia), e ainda com discursos de que 'são coisas do amor, quem sabe um dia eles ainda ficam juntos'. Foi preciso o criminoso/psicopata/doente em questão 'decepcionar' as expectativas dos 'cegos' que não o viam como ameaça para a 'esperança' se transformar em 'silêncio'. As vozes ouvidas a partir daquele momento eram de críticos sérios que não tiveram piedade para apontar todas as falhas gravíssimas da polícia (que já pisara na bola por ter deixado uma das reféns, Nayara, ter saído do cativeiro e entrado de novo para negociar, e por lá ficar novamente).
Em pouco tempo, a história do casal veio à tona sem censuras: dois desequilibrados que em 3 anos de namoro freqüentemente brigavam e ameaçavam a própria integridade física para chamarem atenção um do outro (Eloá já fora vista com uma faca apontada para si mesma, afim de chamar atenção de Lindenberg que 'tinha capacidade de se matar').
No Brasil, os fatos não estão sendo claros o suficiente para serem enxergados nem para setores importantíssimos da sociedade como a imprensa e a polícia. Fica muito difícil confiar no que lemos (talvez por isso os moradores das redondezas do seqüestro foram tão hostis a imprensa sem dar tantas explicações- inclusive ameaçando jornalistas), e mais ainda, nos que 'nos protegem'.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u456939.shtml
http://tsf.sapo.pt/PaginaInicial/Internacional/Interior.aspx?content_id=1030851

Um comentário:

Val Benvindo disse...

Lucas, fico me pergunatando onde é que esse mundo vai parar !
um jovem aparentemente inexperiente driblar a policia desse jeito ?!
é de ficar boquiaberta.
e ainda tem quem defenda esse monstro.
dificil de acreditar, viu ?!
e para os que acreditam,agora é apelar pra justiça divina ..