sábado, 5 de julho de 2014

Jogadores-torcedores & torcedores-justiceiros

Jogadores fazem símbolo do "É Thois" para Neymar - Foto: Divulgação
O Brasil jogou nesta sexta-feira (4) um Futebol maiúsculo. Eu não poderia deixar o triunfo diante da Colômbia passar sem uma postagem no meu blog. Após o apito final, em meio a gritos e abraços pela classificação às semi, eu já sabia o título: “Me sinto menos torcedor do que os jogadores”. Me emocionei, mas não tanto quanto eles, aqueles caras supostamente “cheios de dinheiro que não estão nem aí para resultados, porque continuarão ricos, ao contrário dos torcedores, pois esses sim amam futebol”. Quando escuto discursos como esse, passo a questionar se os murmuradores apenas enxergam a felicidade por via das cifras. Afinal, se é tão difícil imaginar que David Luiz e Thiago Silva, mesmo bem sucedidos, sentem emoção, é porque provavelmente se no lugar deles estivessem, os murmuradores nada sentiriam. Eles, os “chorões”, são a prova de que há vida além do dinheiro, e o dinheiro não compra a emoção de vencer uma partida em seu país, mesmo aos trancos e barrancos.

Foto: Uarlen Valerio / O Tempo
Em uma semana triste, com desabamento de um viaduto que matou duas pessoas e deixou 22 feridas em Belo Horizonte, o luto é aceitável. Eu particularmente passei a refletir o quão displicentes foram os “responsáveis” por essa obra (e tantas outras) e como o “jogo de empurra” esconde os envolvidos, assim como as oito mortes de operários nos estádios do mundial de 2014 (uma em Brasília, uma em Cuiabá, três em São Paulo e três em Manaus). Uma proteção covarde, que não recuperaria as vidas ceifadas sob concreto, mas poderia levar outras tantas tragédias a serem evitadas. A negligência se garante sob a impunidade.

Em meio a toda essa turbulência envolvendo tragédia em Belo Horizonte, cidade em que a Seleção enfrenta a Alemanha nesta terça-feira (8), e fim de Copa para o maior expoente da equipe anfitriã, Neymar, foi inevitável sair do futebol para entrar em um assunto tão sério quanto: o sentimento de ódio e vingança dos brasileiros, especialmente nos últimos anos, que foi tema da minha postagem “Somos tão cordiais assim?”, de 30 de junho. Tão sério quanto, porque futebol para mim é sério e não pode ser apontado como responsável pelas mazelas do país. Por si só, isolado, desperta paixões, o que seria suficiente para respeitá-lo, afinal, não há sentido na vida em sociedade sem suas simbologias e rituais, que pedem licença a razão. “Qual a graça de 22 homens correndo atrás de uma bola?”, se perguntam até hoje alguns, sem obterem resposta. Mas o futebol também diz muito sobre o dia-a-dia e "abre brechas" para os sentimentos menos nobres aflorarem, sob a mesma desculpa dos linchamentos de que a emoção ofuscaria o caráter. Mas não ofusca: revela.

Ouvi a notícia de que Neymar estaria fora da Copa no rádio, enquanto dirigia, no caminho para o aniversário de um amigo. A incredulidade tomou conta de mim, como apenas em momentos especiais do esporte. Morte de Senna, eliminações da Copa, rebaixamentos do Bahia e ataque de padre irlandês ao maratonista Vanderlei Cordeiro de Lima na Olimpíada de 2004, na Grécia. Naquele momento um sentimento de “justiceiro” ameaçou se apossar de mim. A vontade era de escrever logo uma postagem com um título que fosse, no mínimo, “Vai ficar barato dona Fifa?”. Mas respirei fundo. Sabia da responsabilidade de escrever com os nervos à flor da pele, especialmente para mim, jornalista. Estava desacostumado a torcer pela Seleção na Copa. Digo, “torcer pra valer”, já que havia feito cobertura dos últimos três jogos do Brasil na Fan Fest de Salvador e no Pelourinho. Não é a mesma coisa assistir a um jogo com o compromisso de ser ágil na cobertura, repercutir para os leitores do site em que trabalho a atmosfera das aglomerações. 

Infelizmente, na mesma proporção em que Neymar recebe mensagens de solidariedade de pessoas do mundo todo (inclusive minha), brasileiros hostilizam o lateral-direito da Colômbia, Zúñiga, que quebrou uma vértebra do camisa 10 canarinho. As mensagens são pesadíssimas e há até ameaça de morte a ele e sua filha. Não recomendo a leitura para quem não tem estômago forte. A onda de linchamentos no Brasil, provocado sob a desculpa de substituir segurança pública e a justiça, dão outra característica ao brasileiro, descrito como cordial por Sérgio Buarque de Holanda. 

O suposto desequilíbrio emocional dos jogadores nos primeiros jogos da Copa parecem se refletir nas postagens de torcedores que não respiram fundo ou não pensam duas vezes antes de agredir Zúñiga nas redes sociais. E se foi maldade ou não, se merece punição ou foi lance normal do jogo, pouco importa. Me preocupa mais a hostilidade. Essa sim merece ser observada, mais do que qualquer entrada violenta em Neymar nesta Copa.




Foto: Reuters

Obs: Acho que Zúñiga, que também entrou forte em Hulk, deveria pegar um gancho grande pela imprudência, assim como a arbitragem que deixou o jogo correr dessa forma. Recomendo a leitura do post "O NACIONALISMO NAZISTA DO FUTEBOL BRASILEIRO", de Ariane Ferreira. Ganhando ou perdendo para a Alemanha na terça-feira (8) ou na final no domingo (8), estou muito orgulhoso dessa Seleção. Os jogadores estão fazendo o que podem, mas o time não foi bem preparado, o Brasil não tem por tradição manter uma base para dar continuidade a um projeto longo e Scolari, a meu ver, não criou um repertório rico de jogadas. O time chegou às semi pelo talento individual dos jogadores e apoio da torcida.

Nenhum comentário: