quarta-feira, 3 de junho de 2009

A violência da vida em sociedade

Eu me pergunto: o que é paz? Se pomba e bandeira branca são suficientes para ilustrar um cenário apático de conformismo prefiro viver em constante guerra. E talvez, seja inevitável para o nosso mundo o despejo de energia em nome de verdades não compreendidas: a tendência do ser humano, ao contrário do que tentam nos empurrar com mecanismos artificiais, é seguir caminhos diferentes, cada pessoa, cada povo, cada geração, e quando o conceito de 'universal' surge para oprimir a criatividade, ele faz cada ser humano se 'auto-esquecer', seguir regras para viver de forma menos dolorosa na sociedade que reprime condutas transgressoras e pior: de geração em geração, o número de corajosos vem diminuindo, na medida em que a tecnologia facilita a vida comum e aliena a mente que não mais espaço procura para se aprofundar no desconhecido, e sim na objetivação medíocre de tampar buraco, curar, salvar e tudo mais que for a curto prazo.
As tradições têm um papel importante para 'organizar' tamanha bagunça que seria se nós fossemos menos humanos (ou seja, mas instintivos, sem ética, moral e costumes). O ser humano não gosta de 'bagunça': ele quer ter sempre o controle da situação e a certeza que está indo para algum lugar, que tem alguma meta, que manterá o seu conforto e que 'será feliz'. Segundo Schopenhauer, "a felicidade não é senão o momento fugaz da ausência da infelicidade." Não vejo essa tese como universal (afinal, luto cada vez mais contra a corrente que acredita que existem coisas universais, que tocam a todos, que abrange o universo) mas de fato, para o ser humano comum, a felicidade é 'conseguida com a concretização de metas', logo, para ser feliz teria de se ter o que se quer, caso contrário, sobraria um vazio, mas porque o ser humano foge tanto do vazio? Esquecemos o quanto podemos crescer no vazio, o quanto crescemos na instabilidade, quantas idéias não temos quando nossos resultados não dão certo (se dessem sempre certo, nada modificaríamos e a reflexão não pediria para entrar em nossas vidas), o quanto reparamos em coisas antes não observadas quando nos conhecemos por completo, nas diversas situações que nos permitimos entrar, o quanto a sensibilidade aflora os sentidos e o quanto a busca dessas coisas também dependem de nossa coragem.
Na sociedade japonesa, há uma espécie de 'casta inferior' chamada 'Freeter': embora ninguém nasça 'freeter' como na Índia se nasce 'daliti' (intocável), o preço que se paga no Japão por não ser um grande aluno é caro demais: numa sociedade que prega tanto a disciplina (pelo menos para as coisas convencionais), o freeter é visto "como alguém que não se esforçou suficientemente nos estudos e provavelmente não vai cumprir o mais sagrado dos deveres filiais, que é o de dar continuidade à família, já que não tem dinheiro para constituir uma" (revista Veja, 3 de junho de 2009, página 119).
Todos cobram de todos, mesmo nos quesitos em que nada uma pessoa pode colaborar. A vida do próximo é um passatempo, e dos julgamentos baseados na própria ótica nascem o ódio ou a indiferença. Não tem jeito, esqueça paz mundial: se um dia todas as nações pararem de lutar no campo bélico, tenha certeza que há motivo especial para isso (talvez o medo as segurem, e não o sentimento de harmonia), se a probreza for erradicada, tenha certeza que tem benefício para os poderosos, que com mercado consumidor maior poderão ganhar mais e mais dinheiro (e a pobreza 'acabará', surgindo uma grande classe média e uma pequena classe mais rica do que nunca): a paz não vem da tolerância, vem da compreensão de corpo e alma, e dissimulações políticas não deixarão de existir, deixando uma falsa idéia de acordos. Por isso, com excessão das relações íntimas (pois amizade é a coisa mais valiosa que podemos cultivar e devemos escolher bem os nossos amigos) o mundo sempre será violento: não é só o derramamento de sangue que nos mata aos poucos, são todas as agressões as naturezas individuais, que somadas são coletivas, sendo o coletivo algo não uniforme. Para quem abre o olho agora (e eu nunca acho que é tarde demais, pois cada um tem o seu tempo): a Matrix não existe mais, bem vindo ao mundo real.

Um comentário:

Andréia M. G. disse...

Há "verdades" que chocam, mas temos que conviver com elas. Sua constatação foi certeira. Belo texto!