sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Prato típico provoca rivalidade entre Bahia e Espírito Santo

Foto: Divulgação

Conhecido cozido em todo o país que pode ser preparado com peixe ou frutos do mar, além de tomate, coentro e cebola, a moqueca é a responsável por fazer dois estados vizinhos, sem nenhum histórico de rixa, viverem uma briga pela “autonomia gastronômica”.  

A Bahia, no Nordeste, e o Espírito Santo, no Sudeste, dividem a “patente de donos da melhor moqueca”. No entanto, para o capixaba Vanderlei Mozer, a variedade é positiva. Garçom há 29 anos do restaurante São Pedro, em Vitória, Mozer diz defender bem sua bandeira. “Todos aqui dizem que moqueca mesmo é a capixaba, o resto é peixada”, brinca. “Mas eles também fazem um prato muito bom, são apenas costumes diferentes. Para quem não é habituado a comer azeite de dendê e leite de côco, a moqueca baiana pode ser pesada, dar dor de barriga. Mas a rivalidade é sadia, não é uma crítica. É só uma forma de dizer que nosso peixe é o mais gostoso”, completa.

O uso do azeite de dendê e do leite de côco, típico em diversos pratos da culinária baiana, é o que diferencia a moqueca dos dois estados. Garçom há 23 anos do Ki-Mukeka, em Salvador, o baiano Ismael Oliveira diz que a preferência pelos produtos locais não se dá apenas entre seus conterrâneos. “A maioria dos turistas que vêm aqui são de São Paulo e Rio, e eles gostam muito. Quando eles chegam, pensam que nossa moqueca é igual a capixaba. A deles não leva azeite de dendê e leite de côco, e quando provam percebem que a nossa é mais gostosa”, defende. 

Observada sob o ponto de vista científico, a rivalidade gastronômica entre os dois estados é muito importante, defende o doutor em ciências sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Ericivaldo Veiga. “A moqueca se inclui na discussão antropológica sobre a cultura brasileira. O bate-boca é útil quando se pensa em identidades”, diz o sociólogo, que escreveu o artigo “A Essência do Sabor Brasileiro: Segredos da Bahia”.  O sincretismo religioso na Bahia, onde o catolicismose mistura ao candomblé, tem também na moqueca uma ponte de ligação. “A cozinha baiana de origem africana é um subsistema do sistema culinário baiano, que por sua vez é parte do brasileiro. Na mais importante celebração entre os católicos, a Paixão de Cristo, se observa no lugar do jejum um momento apoteótico nas mesas baianas, principalmente no Recôncavo e em Salvador, no qual a cozinha do azeite de dendê ou a cozinha ritual do candomblé formam a maior parte dos pratos, e as moquecas são certas”, completa.

A miscigenação do povo brasileiro e principalmente, do baiano, foi fundamental para “africanizar” o prato indígena, aponta o doutor em antropologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Ordep Serra. “Aqui a gente releu tudo. A cultura negra é muito dominante, seja no modo de cantar, dançar, entre outras coisas. Nós fomos civilizados pelos negros e o povo baiano é bastante misturado”, afirma Ordep.

Na briga entre baianos e capixabas pela preferência nacional, quem ganha são os brasileiros. E você, já provou uma moqueca?

Um comentário:

Unknown disse...

Confesso que mesmo morando aqui já ha 10 anos, o dendê não bate bem...mas sou bairrista e voto na Baiana