sábado, 19 de março de 2011

O momento fast

A velocidade que o mundo nos impõe é cruel e nos tira o que de melhor podemos aproveitar. Os horários encurtam as relações e as rotinas, não é a toa que os fast foods são tão populares. A vida não dura muito mais do que 80 anos, e esse é o melhor pretexto para se jogar e transformar em realidade tudo que ainda é sonho. Temer a decepção inibe a ousadia.

Ao desistir de assistir um jogo decisivo do meu Bahia, deixei de fazer parte do momento mais emocionante desse time na década de 2000. A partida em questão era Bahia x Fast Clube, às 18h do dia 7 de outubro de 2007, e daria vaga para a última fase da Série C daquele ano. Na ocasião, o ABC de Natal viajou ao Acre para enfrentar, no mesmo horário, o Rio Branco. Já classificados, os potiguares não foram com o time completo, e se perdessem para a equipe acreana, o que era provável, o Bahia não teria chances de chegar na última etapa do torneio, que reuniria oito times na disputa por quatro vagas para subir à Serie B de 2008.

Pra que sofrer? Nem liguei o rádio. Nunca deixaria de ser Bahia, mas até um cara otimista como eu sabia que o mais provável era me frustrar se tentasse acompanhar a rodada dupla que definiria o destino do meu time de coração, que passava pelo pior momento da sua história. Lá pelas oito e pouca daquela noite, um estranho foguetório tomou as ruas de onde eu moro. Estávamos longe do São João, mas não era raro a vizinhança quebrar a rotina soltando fogos. Nem me toquei. Pouco depois, o telefone de casa tocou e minha mãe atendeu, enquanto eu estava no meu quarto. Da sala, sua voz ecoou pelos corredores e chegaram ao meu ouvido, em um tom de alegria estranhíssimo para um domingo à noite, horário de poucas boas noticias. Era o meu tio Mareco, um esquadrista (adjetivo para torcedor do Bahia que inventei agora) que há anos mora em Aracaju e nunca deixou de acompanhar o Esquadrão de Aço.

Não vou mentir que antes de ouvir a sua voz, cheguei a imaginar que pudesse ser algo com a classificação do Bahia, afinal, àquela hora a partida já havia terminado. Mas tentei não criar expectativa, até ouvir a notícia vinda de tão longe (356 km) relacionada a algo tão perto de mim: milagre na Fonte Nova! Ao saber de mais detalhes, me dividi entre a alegria de saber que meu Esquadrão estava classificado e a frustração de não ter acompanhado o jogo, uma epopeia fruto da fé da sofrida torcida, do empate sem gols entre Rio Branco e ABC, com direito a pênalti perdido, e para completar, cinco minutos de acréscimo num jogo sem paralisações que justificassem tamanha mãozinha da arbitragem. O gol foi aos 49 do segundo tempo, do sergipano Charles, atacante que, assim como Raudinei, herói do Baianão de 94, ficara eternizado pelo feito histórico, e não pelo futebol que apresentou. Foi de Aracaju que veio a informação do tento, assim como nela nasceu o seu autor: nem mesmo uma tradicional feijoada sergipana, com muita abóbora, seria tão saborosa quanto o novo prato da terra do caranguejo, o gol sobre o Fast Clube. Mas eu só o provei frio, embora ainda estivesse uma delícia.

O fim da década de 2000 deu amostras de como os anos 2010 podem ser diferentes para o Bahia: título brasileiro de 1959 reconhecido, acesso para a Série A do Brasileiro garantido e planejamento para a construção de um novo CT, que a longo prazo nos dará ótimos frutos. Não quero ver o Bahia em situações como a do jogo do Fast nunca mais, mas independente do que aconteça, terei mais coragem para acompanhar todos os jogos, e quem sabe, poder contar o quanto foi difícil acompanhar uma partida em que tudo conspirava contra, e ainda assim, as coisas deram certo. Mas prefiro superações na Libertadores do que na Série C, por favor.

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